sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Registro de Viagem à Costa do Marfim: Relato VI - Plano de MKT, Pepsi explosiva, o taxista mijão e o dentuço



Registro de Viagem: Costa do Marfim

Relato VI – Plano de MKT, Pepsi explosiva, o taxista mijão e o dentuço – 15 e 16 de Dezembro

Hoje eu e Wilfred trabalhamos bastante. Chegamos pouco antes das 08h e fomos diretos até 17h sem interrupção NENHUMA. Nosso ambicioso plano de marketing tem pré-etapas que são basicamente coleta de informações, pois a empresa não tem estrutura nenhuma desse tipo de coisa: dados de clientes, comunicação, relatórios de desempenho próprio e nem da concorrência e por aí vai. Antes, deixe-me explicar um pouco essa empresa.

Ela se chama AFCO Express e é como um concorrente do serviço postal do governo. Como os correios daqui são muito ruins, há uma série de empresas que operam nesse setor. A AFCO é a mais antiga empresa marfinense do ramo (fundada em 1990) e, devido à ser a pioneira, adquiriu vantagem significativa em conseguir participação de mercado. Contudo, a globalização chegou aqui no início da presente década e companhias como UPS, Fedex e DHL começaram a operar também. Essas gigantes, contudo, não competem conosco – ufa! – mas fazem parcerias com empresas locais para que elas se encarreguem das entregas internacionais à Costa do Marfim. É aí que entramos. Mas também atuamos como correios locais entre empresas e instituições locais. Entre nossos clientes, figuram a Shell, a Chevron, o United Bank of Africa (UBA) e o World Bank. A nossa sorte é que a concorrência é tão antiquada quanto a AFCO. Em um mercado maduro, nossa estrutura enferrujada, de pouca comnicação com os clientes e de autoritarismo do chefe se desfaria rapidamente. Como a tendência do país agora é a maturação do mercado desde que a guerra civil acabou em 2006, eu e Wilfred queremos aproveitar que a concorrência é mais débil do que nós para melhorarmos a AFCO. A AFCO foi pioneira no setor e novamente será pioneira (se tudo der certo!), mas dessa vez em aplicação de políticas de relacionamento com o cliente.

O nosso portfólio de vendas está 99% pronto (só falta melhorar o design da capa, o conteúdo interno e os contratos nós já terminamos) e estamos segmentando o mercado de Abidjan – já separei 45 embaixadas e representações diplomáticas que poderiam utilizar nosso serviço e Wilfred fez o mesmo com bancos e ONGs humanitárias internacionais. O chefe está vendo as maravilhas que acontecem quando se trabalha com internet e ele agora nos deixa ficar algum tempo no escritório dele para usar a internet. Infelizmente, ela não é wi-fi e só há um cabo. Então eu e Wilfred temos de revezar.

Quando saímos da empresa às 17h, demos conta de que não havíamos comido o dia inteiro. Fomos a um mercado muito bom perto do ponto em que pegamos a lotação de sempre. Esse mercado é caríssimo para os padrões locais – apesar de não ser nada perto de São Paulo – e parece um mercado brasileiro normal: ar-condicionado, ilhas de degustação, guarda-bolsas etc. Comprei um sanduíche e uma Pepsi e deu 600 francos. Infelizmente, eu só tinha uma nota de 10000 francos. A mulher do caixa virou uma arara. Berrou, gritou, deu-me uma esculhambação e tudo que eu podia dizer era pardon e je suis desolé. Ela foi lá dentro pegar troco e trouxe-o junto com a Pepsi. Fui embora meio assustado e, quando entramos no táxi e abri a Pepsi, a garrafa fez aquele negócio que sempre faz quando alguém chacoalha um recipiente de conteúdo líquido gaseificado. “Miserável!”, pensei, lembrando-me de minha desafeta que devia estar maquiavelicamente gargalhando em seu caixa nessa hora para completo espanto do cliente da vez.

Bem, o táxi partiu. Dos motoristas loucos que vi por aqui, nunca vi nenhum tão doido quanto esse taxista. O cara fechava até as viaturas da ONU levando doações internacionais. Lá pras tantas, o cara puxou pro acostamento e disse excusez-moi deux minutes, je vais pisser très vite. Como acontece com todo mundo que está aprendendo um novo idioma, o significado de algo só vem à mente algum tempinho depois. Além disso, concluí ser algo bem comum, pois ninguém no carro se surpreendeu. Quando dei por mim, perguntei pro Wilfred se o cara realmente tinha dito que ia fazer xixi rapidinho. O Wilfred respondeu que sim, mas não acreditei e virei pra trás. Foi aí que vi o figuraça do taxista em “posição de tiro” olhando pro céu e um jatinho atingindo o matinho do acostamento após perfazer um arco de parábola. Depois, o sujeito volta ao táxi, liga o rádio e começa a cantar logo após cantar pneus e entrar na auto-estrada. Nada de anormal acontecera ali. Que é um xixizinho na rua de vez em quando, né?

Chegando em casa, a Roxanne, que brincava na areia na frente do cortiço, berrou e saiu todo mundo pra vir me desejar o bom arrivé costumaz (assim que der, posto uma foto que tirei dela se agarrando na mãe com medo de mim). Tomei banho, fui ao culto na igreja batista e, após voltar, comi ovo com mamão e banana (mistureba gostoso). Após o jantar, estava relendo os textos da aula de estratégia para o trabalho quando chega bastante gente na casa e escuto me chamarem. Pelo que entendi, eram parentes da mãe da família que vieram me ver. Agradeci a gentileza e conversei com eles na medida do possível do meu francês. O filho da visitante, contudo, é o capeta em pessoa e me chamou de dentuço (gros dent, ou algo do tipo; de qualquer forma, pronuncia-se “grô dã”). Os visitantes foram embora e vim aqui escrever.

Agora vou me preparar para dormir e arrumar as coisas para amanhã. Mais uma vez, agradeço as orações dos irmãos e peço-lhes que ponham também esse país e essa gente em suas preces. Forte abraço a todos.

Que Deus os guarde.

Ne vous laissez pas dominer, dans votre conduite, par l’amour d’argent ; contentez-vous de ce que vous avez, car Dieu a dit : « Je ne te laisserai pas, je ne t’abandonnerai jamais. » - Hebreux 13 :5

4 comentários:

Ligia Cerqueira disse...

Dentuço? Ora mais! É o sorriso mais lindo que eu já vi! ;)
Algo me diz que o bebê da foto é a Roxanne... coisa fofa!

Natan Cerqueira disse...

É a Roxanne, sim. Hehe

Sarinha! disse...

1) Tu tá cada vez mais lindo.
2) Se fosse eu, tinha voltado no supermercado e partido pra briga com a mulher do caixa. Mar num tô dizendo mermo!
3) Parabéns pela iniciativa de vcs! Dois estagiários vão fazer história na empresa!
4) Bolei de rir com a cara da Roxanne chorando! Tadinha da bichinha!
5) Coloca mais foto do Chrisson (não lembro como fala o nome dele). Me apaixonei!!

Te amo, lindão!

Daniel e Gláucia disse...

Já vi criança se apavorar com pessoas feias, o que não é o seu caso meu lindo, mas por ser branco? Tadinha, deve ter nunca visto um!!